22.3.09

RA D IOHEA_D

Radiohead no Brasil em março. Opa, mais um caô pra coleção de alarmes falsos, pensei. Radiohead e Brasil? Impossível, eles já têm vinte anos de carreira e nada de vir... Ainda mais com Thom Yorke preocupado com a poluição causada pelos aviões cruzando o Atlântico, é pra matar as esperanças de qualquer brasileiro que não desiste nunca!

Mas dessa vez era verdade. Verdade tão verdadeira e desesperadamente esperada que começaram a vender os ingressos pela internet duas horas antes do anunciado. Eu, é claro, comprei durante essas horas antes. E contei os segundos que faltavam pra 20 de março de 2009, quando o Radiohead finalmente estrearia em terras brasileiras no festival Just A Fest, tendo Los Hermanos e Karftwerk como convidados.

Fui pra Apoteose às quatro da tarde do grande dia e já me deparei com uma fila gigantesca de indies, geeks e devotos de Los Hermanos ansiosos. Encontrei um grande amigo e fizemos amizade com dois rapazes que estavam na fila, um vindo de Salvador só para ver Kraftwerk e Radiohead juntos, e outro vindo de meu feudo (Jacarepaguá) pra testemunhar a primeira reunião de Amarante e cia. em dois anos. Quando abriram os portões, cerca de uma hora depois, a coisa parecia cena de Carruagens de Fogo: o povo correndo como se não houvesse amanhã e as bandas fossem fugir, milhares de pares de All Star castigando a avenida. Vinte anos de espera (quase dez no meu caso) dão nisso.



Eu e meu amigo encontramos um bom lugar, mais ou menos na frente e bem no meio. Só que precisamos ir ao banheiro (enquanto esperava por ele, gravei uma segunda leva de pessoas correndo loucamente para o palco) e quase perdemos o lugar ao voltar. Sorte é que reencontramos nosso amigo baiano, instalado ainda mais à frente e lá ficamos, só no suor e na alegria, espremidos pelos devotos dos Los Hermanos ("fã de Los Hermanos" no ecziste, são todos devotos). De qualquer forma, plantamos nossas raízes e nem uma avalanche nos tiraria de lá, era só esperar.



Era umas sete da noite quando Camelo, Amarante, os outros Hermanos e uma banda de metais entraram num palco sem efeitos visuais, apenas com instrumentos. Começaram o show com todo o gás acumulado em dois anos, tocando "Todo carnaval tem seu fim", "O Vencedor" e outras músicas que fizeram devotos delirar e não-devotos como eu (gosto de Los Hermanos, mas não idolatro) pular. Ainda vieram outras babas como "Último Romance" e "Cara Estranho", mas depois o show caiu de produção, ficou sem pegada, já que os Hermanos resolveram apostar em músicas conhecidas apenas pelo seu fiel séquito. Os muitos que foram só pelo Radiohead e os gatos pingados que estavam lá pelo Kraftwerk boiaram, e foi bem irritante ser constantemente empurrada por devotos fervorosos e incansáveis. Na minha humilde opinião, eles deveriam intercalar as músicas conhecidas por todos, mais incendiárias, com as obscuras pra manter um ritmo mais regular. Ao final, sem bis, os fiéis gritavam "Volta, Los Hermanos!", o que ainda é um mistério.

Depois do retorno dos Hermanos, um palco totalmente diferente, onde se destacavam quatro laptops (merchan do Sony Vaio, alguém?) foi sendo montado pro Kraftwerk, grupo alemão que está na gênese da música eletrônica. Ao contrário do show anterior, a apresentação dos quatro alemães (apenas um da formação original) foi um espetáculo visual, tecnológico e contemplativo, já que tem que ser muito indie aqui no Brasil pra conhecer mais do que três músicas. O ponto alto pra mim foi "Das Modell", umas das três que eu já conheçia de antes. O Kraftwerk tem uma postura totalmente robótica e eles não mostram qualquer emoção durante as músicas, mas era engraçado ver os momentos em que se traíam mexendo sutilmente as pernas ou os ombros. Antes do bis, as quatro pessoas no palco foram substituídas por robôs que tocaram "Die roboter", outro bom momento. Eles voltaram vestindo uma roupa cheia de teias incandescentes, pra combinar com o visual da última música, que não lembro qual era. Apesar disso, gostei bastante, entendi que Kraftwerk é mais música pro cérebro que pro corpo.

Dali em diante, espera. Angústia, ansiedade e incredulidade. Eu não conseguia acreditar que, dentro de alguns minutos, eu veria a banda que faz as músicas que mais falam de mim. Enquanto isso, tentava conseguir um lugar ainda melhor, mas tinha um muro de Berlim na minha frente e uma Muralha da China do outro lado, fora que aquela lombada preta dividindo a pista ao meio atrapalhava muito.

Abstraí tudo isso e comecei a gritar que nem criança com os primeiros acordes de "15 Step". Um Thom Yorke cabeludo usava jaqueta de couro naquele calor, mas ele logo tirou. O mesmo não fizeram os guitarristas Ed O'Brien - de paletó e cachecol - e Johnny Greenwood, ressuscitando o grunge com um casaquinho de flanela. Depois veio "Air Bag", a ótima faixa de abertura do Ok Computer e eu comemorei, já que é meu álbum preferido. Em seguida, Thom anunciou que vinha "uma legal", "There There". Legal é pouco, Thomas, "There There" é bombástica, tremi toda com aquela percussão. Devo destacar também a iluminação do palco, com aquelas lâmpadas verticais pendendo do teto e dando uma atmosfera particular a cada momento do show (em músicas lentas, o palco ficava azul ou verde, em trechos mais agitados, as lâmpadas ficavam vermelhas ou piscando freneticamente em branco, arco-íris, etc), uma bela sacada da produção.



Voltando às músicas, depois veio uma de baixo bem marcado, "All I Need", uma das melhores do In Rainbows. Em seguida, para delírio do público, "Karma Police", um clássico que todos cantaram. E, quando todos pensaram que a música tinha acabado, a banda nos deu de brinde mais uns minutos cantando o final "I lost myself! I loooost myseeeeeelf". Maravilha. Logo vieram "Nude", "Weird Fishes", "The National Anthem" (que dancei como doida), "The Gloaming", "Faust Arp"e "No Surprises", o momento em que quase chorei. Nunca parei pra pensar, mas essa deve ser a minha música preferida do Radiohead, pelo menos é a preferida do álbum preferido, então...



Depois do quase chororô, o ótimo primeiro single do In Rainbows, "Jigsaw Falling Into Place", e a pomba-gira baixou em mim com "Idioteque". Daí foram "I Might Be Wrong", "Street Spirit", "Bodysnatchers" e "How To Disappear Completely", sempre com a iluminação de acordo com a energia da música. Com mais de uma hora de show e já contando 17 músicas, a banda saiu e voltou pro primeiro bis, com "Videotape", "Paranoid Android" (que levou a plateia e o espaço da minha câmera abaixo), "House of Cards", "Just" (outra que matou a pau) e "Everything In Its Right Place", uma das melhores do Kid A.

E eis que eles saem de novo. Como assim?, no México foram vinte e cinco músicas e eles ainda não agradeceram! Na dúvida, melhor ficar no lugar. E eles, de fato, voltaram. Thom Yorke, sentando ao piano, dedicou a próxima música - "You and Whose Army", do Amnesiac - "a todas as horas em que os norte-americanos tentaram f****r com vocês". O povo quase morreu de tanto vibrar. Durante essa música, ele ficou com a cara fechada na câmera do piano, fazendo com que aparecesse um Thom Yorke gigante no telão, que parecia olhar pra cada um de nós. Então veio mais uma do In Rainbows, "Reckoner"; e o réquiem, que não poderia ser mais apropriado, "Creep", música que eles não tocavam há séculos antes do show no México e que estava nos sonhos de todos os que sonhavam com Radiohead no Brasil.

Depois do "obrigado" surpreendentemente sem sotaque do Thom, eu não queria acreditar que tinha acabado. Os pés doíam, a coluna ardia, mas se tivesse como, voltaria no tempo e veria de novo, em pé e sem água (aliás, um ABSURDO um copo d'água por seis reais!). Saindo de lá, o que eu mais queria na minha vida era dinheiro pra vê-los de novo e viver tudo mais uma vez em São Paulo.

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